quarta-feira, 16 de agosto de 2006

A Tolerância

A Tolerância sob Enfoque Huna

Ao estudar a tolerância sob o enfoque Huna, não poderíamos iniciar este trabalho sem antes avaliar a situação de nosso mundo atual, que faz do intolerantismo a base das atitudes e ações.

Essa condição propicia o egoísmo que se instaura e se caracteriza ao generalizar um tipo de comportamento que vai do individuo até as mais importantes comunidades, sem distinção de
crenças, desenvolvimento tecnológico e científico, atingindo as camadas sociais e economicamente inferiorizadas, chegando aos famintos e aos que estão abandonados à própria sorte.



A intolerância é também ardilosa e sua tônica atual, está muito ligada à
beligerância. A primeira mudança pensada é de que as guerras agora serão
diferentes e então, ter-se-á de pensar de forma diferente, isto é, fazer uma
guerra com outras técnicas. Parece que essa estratégia só vai mudar o modo
de matar. No entanto, pode ser o primeiro passo para as mudanças que se
fazem necessárias.

O ser humano intolerante não consegue ter a percepção de seu semelhante, a
não ser dentro dos parâmetros traçados por sua comunidade onde cada vez se
isola mais com a justificativa do bem estar pessoal, baseado no conforto e
na comodidade, perdendo a conexão com as diferentes culturas, criando assim,
um círculo vicioso que se perde nas idéias e crenças, tornando-as também
intolerantes, em nome geralmente de um Deus rancoroso e sem compaixão.

A solidariedade desapareceu dando lugar ao poder e à prepotência. É na
busca da compreensão dessa intolerância que nos propusemos a dedicar um
pouco de nosso tempo no entendimento da tolerância, com a esperança de que
um dia o homem reconheça que sua paz e tranqüilidade não estão nos padrões
vigentes, mas na volta para dentro de si mesmo em busca do divino que ai se
encontra. Esse despertar divino cria naturalmente a possibilidade de
mudanças com novos padrões, transformando o relacionamento do ser humano,
que passa a enxergar não o outro, mas o seu próximo; é o compartilhar
com...

Que torna o homem feliz.


Definições de tolerância:


1. Dicionário - Aurélio Buarque de Holanda

Qualidade de tolerante; ato ou efeito de tolerar. Tendência a admitir modos
de pensar, de agir e sentir que diferem dos de um indivíduo ou de grupos
determinados, políticos, religiosos.

Diferença máxima admitida entre um valor especificado e o obtido; margem
especificada como admissível para o erro em uma medida ou para discrepância
em relação a um padrão.


2. Dicionário - Michaelis

1. Direito que se reconhece aos outros de terem opiniões diferentes ou até
diametralmente opostas às nossas. 2. Boa disposição dos que ouvem com
paciência opiniões opostas às suas.

Sociologia: Atitude social de quem reconhece aos outros o direito de
manifestar diferenças de conduta e de opinião, mesmo sem aprová-las.


3. Em Inglês, "Tolerate" é a palavra para tolerância.


4.De acordo com o "HAWAIIAN DICTIONARY" (Hawaiian-English/
English-Hawaiian) de Mary Kawena Pukui e Samuel H. Elbert, a palavra inglesa
"tolerate" quando se refere à situações ligadas à Língua Havaiana é
substituída pela palavra "endure", que corresponde em havaiano às palavras:
'alo, ahonui, mau e o. 'Alo significa esquivar, evadir, escapar, evitar, omitir; omissão; estar
com, chegar perto, ir com, escoltar, acompanhar, compartilhar uma
experiência, perseverar, resistir e cuidar;

Ahonui significa paciência, paciente - tolerar.

Mau significa sempre, constante, permanente, perpétuo, firme, preservação e
continuidade.

o significa responder, concordar, dizer, falar, tinir, badalar do sino;
ressoar; dar soco, som do apito, permanecer, tolerar, sobreviver, continuar,
existir, provisão de alimentos para uma viagem marítima.
Como vimos há uma gama enorme de interpretações em relação à palavra
tolerância em ambas culturas, não havendo uma definição clara e concisa.
O sentido que geralmente damos à tolerância é o de estarmos suportando
alguém ou uma situação da qual discordamos e não aceitamos, mas que por
educação, benevolência, filantropia e, às vezes, até como um ato de
caridade, escutamos ou agimos achando que estamos fazendo algo de bom para
não contrariar pessoas que são importantes para nós, ou situações que podem
ser passageiras e que, agindo assim, a pessoa se beneficie com algum novo
pensamento que lhe surja ou a situação se modifique, podendo eliminar ou
diminuir possíveis atritos.

Com essa maneira de agir estaremos satisfazendo nossos desejos, nossa
vaidade; seremos conselheiros bem compreendidos e atuantes e "humildemente"
nos comportamos no papel de benfeitores e, até poderemos agradecer a Deus
pela inspiração de ouvinte, contribuindo para a resolução do caso.
Intelectualmente há uma grande satisfação e passamos a nos ver como uma
pessoa melhor e que praticou um ato de benevolência e assim, estaremos
crendo que nossa influência fez com que houvesse mudanças no bom sentido ou
pelo menos, uma amenização da situação. No entanto, estamos esquecendo que
foram criadas memórias que serão arquivadas e não correspondem à verdade de
nosso sonho básico de vida[1].

As próprias definições dos dicionários colocam que são atitudes que tomamos
com determinado tipo de comportamento, mas que não é verdadeiramente o que
sentimos ou pensamos. Sendo assim, não é uma realidade, mas uma benfazeja
ilusão e como toda ilusão, é enganadora no sentido de um crescimento ou
evolução interior.

No fundo satisfizemos um desejo de atuar em benefício dos outros de uma
maneira hipoteticamente conciliadora. Se quisermos saber a verdade,
invertamos os papéis colocando-nos na situação do outro e procuremos sentir
como ele se sentiria se pudesse pensar o que estamos realmente fazendo.
Cremos que seriamos julgados e criticados como falsos e desinteressados do
que está expondo. O mais correto seria não provocarmos irritação ou
discussões, mas fazermos uma colocação que trouxesse benefícios reais, sem a
preocupação de resolução do problema, que diz respeito ao outro e que sua
cura dependerá da nossa cura, o que só acontecerá com uma ação correta
diante da situação e de nós mesmos.

Agindo sem a busca da verdade, pode aparentemente ser uma boa ação, mas
também poderá incentivar um comportamento prejudicial, e, sendo assim,
poderemos perguntar: tolerância será realmente isso?

Nas situações definidas em nossos dicionários de Língua Portuguesa, fica a
impressão de que sempre estaremos ouvindo algo com que não concordamos, mas
que ouviremos pacientemente, satisfazendo uma situação exterior que nada tem
a ver com nossa realidade interna. Como dissemos é uma maneira de se evitar
discussões, atritos ou desentendimentos que podem muitas vezes chegar a
extremos desastrosos, quando não temos condições de agir adequada e
verdadeiramente.

É possível controlarmos determinada situação, mas isso não resolve o
problema do querelante que geralmente irá continuar pensando ou sentindo da
mesma forma ou de maneira ampliada. É mais um exercício de paciência para
treinamento de nosso controle interno, o que pode, no entanto, causar tensão
ou mesmo estresse. De um modo geral, ser tolerante nesse sentido é enganar a
si mesmo e aos outros, passando por uma pessoa compreensiva, quando na
realidade é uma atitude de medo e insegurança, acompanhada de
justificativas.

Sob o enfoque Huna, o caminho da tolerância é bem mais longo e requer uma
percepção mais aguçada do sentido das palavras, pois cada uma encerra em
suas raízes e na própria palavra, conceitos que parecem paradoxais, mas que
na verdade são caminhos a serem delineados. Essa é uma situação comum em
relação a essa língua.

Como vimos, quatro são as palavras havaianas com significado de tolerância,
na tradução do "Hawaiian Dictionary" de Mary Kawena Pukui e Samuel H.
Elbert, tendo cada uma várias interpretações, dependendo inclusive da
maneira de pronunciá-las, como alertam todos os autores.
Em havaiano, tolerância é 'alo, ahonui, mau e o.
Analisaremos cada uma delas:

'Alo, pelo seu significado dá margem a uma seqüência de interpretações, que
vai desde evadir, esquivar, fugir, omissão, evitar, continuando com os
significados de estar com, chegar perto, ir com, acompanhar e culminando com
compartilhar uma experiência, perseverar, resistir e cuidar.

Essa é uma seqüência comum nas palavras da língua havaiana, que de acordo
com a situação, seus significados vão de um extremo a outro, mostrando o
sentido de crescimento e evolução que pode acontecer com um indivíduo e com
as coisas em geral. Temos de pensar que é uma língua que foi elaborada no
antigo Havai'i, em Mu[2], para uma linguagem em que os ensinamentos secretos
pudessem ser incluídos e fossem percebidos pelos sacerdotes do Templo, os
(kahuna)[3] e os iniciados que transmitiram oralmente através dos milênios,
os ensinamentos da Huna.

Podemos verificar que há uma seqüência nos significados da palavra 'alo, que
vai de fugir, omissão, até estar com, compartilhar a perseverar e cuidar,
indicando o caminho que devemos trilhar, quando nos referimos à tolerância.

O tolerante inicial está fugindo do compromisso consigo mesmo de colocar-se
de acordo com a verdade sentida no momento em que está ouvindo alguém, sejam
quais forem as justificativas para tal procedimento. Ele se omite como uma
forma de se preservar, pensando evitar conflitos ou desavenças, que nesse
momento julga serem inconvenientes, podendo, no entanto, se tornarem
desastrosas, mas são sempre justificativas ou ignorância em relação a seus
valores interiores.

Com o desenvolver e crescimento do sonho básico de vida,
as experiências vivenciadas e aprendidas vão formando novas memórias que
ampliam sua percepção, criando condições para um crescimento interior,
chegando à condição de estar com, o que indica um entendimento maior da
situação e um envolvimento com quem está expondo algo; agora é capaz de dar
algo de si sem interferir no resultado, que é fator exclusivo de quem se
coloca.

Quando atinge um grau maior de crescimento com alguma evolução é
capaz de compartilhar; nessa situação está sentindo mais do que julgando, o
que beneficiará primeiro a si mesmo e também ao outro, contribuindo
indiretamente com o todo. Quando se compartilha, os frutos são as mudanças
que levam à perseverança. É uma condição essencial de quem, com uma nova
percepção se torna capaz de compreender o que está compartilhando e passa a
cuidar de si sem se preocupar com o outro, por já estar integrado na ação,
sabendo que tudo pertence ao todo (teia-aka).

Daí, o caminho da tolerância ser longo e dependente de nossas ações, pois só
assim, poderemos mudar a percepção que inicialmente vinha de fora para
dentro e que com o "compartilhar" passa a ser uma situação interior, um
despertar de Aloha (amar é compartilhar com...), pela benevolência de Mana
(todo poder vem de dentro), ambos como Princípios do xamanismo havaiano.
Isso indica a harmonia entre o unihipili (subconsciente) e uhane
(consciente) facilitando a ação do Aumakua (Superconsciente).

A perseverança conduz a uma nova percepção que nos mostra que o cuidar de si mesmo é de
vital importância para que possamos chegar à compreensão da bênção recebida
por termos mudado de padrão, passando de observador que escuta, para um ser
que compartilha, vivenciando de dentro para fora e sabendo da integração
havida, desaparecendo a separação ilusória que nos distancia um do outro,
surgindo assim, o nosso próximo.

Em 'alo, a tolerância se torna uma realidade quando percorremos todo esse
caminho de mudanças, percebendo os novos valores despertados.
Ahonui significa paciência, paciente - tolerar.
Essa palavra nos mostra que somente pela paciência poderemos percorrer o
caminho que nos conduz à real tolerância. Esse caminho é feito através das
vidas sucessivas que nos propicia pela evolução, o sentir da harmonia entre
os três espíritos, criando condições de viver no novo Ike (o mundo é o que
penso que ele é), formado por novos padrões.

Mau significa, sempre, constante, permanente, perpétuo, firme, preservação e
continuidade.
Adquirindo as situações descritas, criamos as condições necessárias para
sentirmos os significados da palavra mau. A partir daí estaremos sempre,
constante e permanentemente com a firmeza da crença sem dúvida (paulele),
que conseguimos pela mudança dos padrões que só surgem e evoluem através das
ações experienciadas em nosso sonho básico de vida e suas modificações, e,
pela continuidade das mudanças, compreenderemos a realidade dos Sete
Princípios que nos integra na teia-aka[4], como seres perpétuos que estão
regressando como crianças de Tane[5] dignas de vivenciar no Reino do Pai a
imagem e semelhança que somos.

o significa responder, concordar, dizer, falar, tinir, badalar do sino;
ressoar; dar soco, som do apito, permanecer, tolerar, sobreviver, continuar,
existir, provisão de alimentos para uma viagem marítima.
Com o, temos a resposta de nossas ações iniciais e que aos poucos passaram
a ter um sentido diferente, conduzindo-nos a uma existência diferente, na
qual a concordância vem da compreensão dada por Aumakua que nos provê de
alimentos para essa grande viagem através dos mares revoltos de nossas
vivencias. Elas vêm nas memórias genéticas programadas que com as memórias
aprendidas, formadas pelas experiências vivenciadas em cada sonho básico de
vida; permitem a continuidade do ser em busca de sua condição de "criança de
Tane" que evolui para as novas moradas da casa do Pai, sendo a Huna[6] um
desses caminhos.

Concluímos dizendo que a tolerância de nossos dicionários não conduz o ser
humano às mudanças interiores necessárias para uma harmonia e paz interna
que se refletirão no todo. É curando-se que se pode contribuir para a cura
dos outros, e assim, unidos, poderemos curar o mundo integrando tudo na
teia-aka, acabando com a separação ilusória criada pela individualização.


Sebastião de Melo














































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